Roses - Sextus: Damnare Exercitacione

Roses (@Srta_Park)
Sextus: Damnare Exercitatione

Jeongguk suspirou pela milésima vez naquele fatídico dia. Largou o objeto pesado por sobre a mesa e fechou os olhos, levando seu dedo indicador e polegar da mão direita até eles, massageando impaciente as pálpebras cansadas. Sentia-se um pouco tonto e seus olhos pesavam de tanto ler e reler aquelas drogas de letras miúdas naquele imenso livro velho e amarelado posto à sua frente, aberto em cima e ao lado de diversos outros separados por lidos e ainda não lidos.
Fazia cerca de duas semanas desde que havia descoberto o que de fato era; e desde então, não tivera sossego em um instante sequer. O príncipe estava sempre apressado e irritadiço, andando de um lado para o outro e trazendo-lhe cada vez mais coisas para fazer; e não estou referindo-me a trabalho braçal ou algo do tipo. Antes fosse, afinal, assim Jeongguk não estaria sendo tão resmungão ou reclamaria segundo após segundo. Certo que o alfa não era lá alguém de porte ranzinza ou rebelde ao ponto de negligenciar algo considerado tão importante — mesmo que não fosse tanto para si. Mas a questão é: podiam lhe jogar as maiores tralhas para carregar ou os mais extensos terrenos para cultivar e não reclamaria um instante sequer, ao contrário, o faria com uma calmaria no rosto e um assobio melodioso proveniente de sua garganta; mas que não o dessem livros para ler. Céus, Jeon odiava palavras escritas e todos os contextos que nela haviam.
De fato, alguns dos rapazes na vila costumavam estudar diariamente e esbanjar sua sabedoria pelos arredores, alegando que iriam se alistar e passar no exame para erudito que ocorria anualmente no reino. Algumas moças também queriam e, embora fosse extremamente difícil que uma delas adentrassem, sequer, o salão de provas, em alguma de suas passagens pelo vilarejo para comprar alguns medicamentos, rações para animais e fertilizantes quando necessário, frequentemente as ouvia recitar poesias ou algumas obras de Confúcio.
Mas o lúpus nem mesmo queria chegar perto do cheiro de um livro; lhe dava dores de cabeça só de imaginar. Certo que seu próprio pai, a quem outrora serviu à Coroa como erudito, o taxava de ignorante por não querer saber dos estudos, mesmo sendo incentivado por ele desde a infância. Mas, o que poderia fazer quando segurar o cabo da enxada, alimentar os seus bichos, cultivar suas plantas e sentir a areia molhada sujar-lhe os dedos, era o que mais gostava de fazer na vida? Deveriam lhe entender, horas!
E agora tinha o príncipe e seu conselheiro — mais pra guarda-costas — que lhe enchia a cabeça com histórias de clãs, reinos, lendas, tragédias, maldições e outras mil coisas das quais não entendia nada. De início, não entendeu bem o que eles quiseram dizer com que iriam treiná-los e ajudá-los a desenvolver sua forma real — outra coisa que não entendia. Acaso, era falso, por acaso? — e talvez fosse melhor não ter entendido mesmo. No entanto, sua falta de conhecimento não duraria muito já que, naquela mesma noite, foram postos imensos e grossos livros sobre suas mãos para que os lessem e, segundo as palavras de Namjoon, adquirisse ao menos o mínimo do que já deveria saber e com isso, poderia aprender alguma forma de desfazer a magia que diziam que a rainha pôs naquele pequeno e inocente ômega.
Inocente o caramba! Ele poderia até ser, quando não portasse aquela carranca séria, em pé a sua frente, segurando uma vareta muito da ameaçadora e lhe encarando, vez ou outra, com uma feição de poucos amigos.
Qual era o problema dele, afinal? Hora estava agindo gentilmente consigo, daquela forma meiga e tímida, e na outra parecia que o capeta — que Deus o perdoe pelas palavras impensadas, pensou. — havia encarnado em seu corpo e ele estava analisando alguma forma de exorcizá-lo e selá-lo o mais rápido possível.
Eles sequer sabiam o que deveria fazer para, supostamente, quebrar a maldição e vieram para cima de si todos pomposos com até mesmo ameaças de morte. Certo que não deveria estar reclamando tanto de algo que parecia ser importante; mas, qual é? Nem realmente era tão grave assim. Algumas marquinhas sobre a pele leitosa do príncipe, uh? Grande coisa! O que isso podia gerar? No máximo, ele não poderia tornar-se rei ou o esposo de um. De qualquer forma, ele estava exilado e isso não iria acontecer de qualquer maneira, certo? Além de que nem é como se fosse um caso de vida ou morte, pensou.
Por fim, suspirou outra vez, se recostando a poltrona macia na qual estava sentado e fitou de esguelha a figura prostrada à sua frente. Ele estava sério, parecendo concentrado em um dos exemplares que mantinha em mãos. Com a cabeça um pouco mais fria depois de descontar sua frustração naqueles pensamentos infundados e estúpidos, aquietou-se e se deixou analisar um pouco melhor a situação. Estava cansado, isso é fato, mas sentia-se um egoísta por estar julgando o garoto — ainda que não verbalizasse — por estar querendo voltar a ter uma vida normal, ou ao menos não tão incomum.
Deveria ser uma barra ter de viver dezoito anos em um castelo frio e quase sem vida, aprendendo a se virar para sobreviver ali, quando todo o mundo afora difamava seu nome mais do que se fosse um dragão demônio, criando histórias infundadas sobre a sua pessoa. Realmente, deveria ter sido muito difícil manter-se de pé e não se deixar abalar por tudo o que aconteceu em sua vida desde que foi ordenado, pelo próprio pai, a viver afastado de sua cidade e sua família.
Estava fadigado e farto por ter passado somente duas semanas afastado de sua casa e tendo de fazer algo que não gosta, imagina ele que foi submetido a isso a vida inteira? Além de que, podia estar tendo muito trabalho com aquilo, mas teria mais caso o mais velho não estivesse lendo tudo, organizando, resumindo e separando as partes que julgava ser mais importantes para que aprendesse.
De tanto observar o ômega, se viu preso em um universo totalmente alternativo do que estava; um em que somente os dois viviam. Todo o ao redor pareceu ter desaparecido à medida que seus olhos apenas conseguiam focar naqueles orbes direcionadas às folhas amareladas por trás das lentes de seus óculos arredondados, os quais somente serviam para lhe deixar ainda mais belo, movendo-se rapidamente e vez ou outra se apertando para dissipar um pouco do cansaço; naquela boca rosadinha e entreaberta, úmida de tanto ser molhada por aquela língua impaciente e movendo-se quase que imperceptivelmente vez ou outra, acompanhando as palavras que ali via. Seu peito se aqueceu e, como se fosse fadado a isso, os batimentos de seu coração afoito se acelerou de uma forma que o fez temer que o garoto os ouvisse, corando-lhe levemente as bochechas pelo pensamento.
Realmente, não estava nada bem; e teve a total certeza disso quando ele pareceu notar como a presença de seu lúpus se fez mais forte, direcionando o olhar a si por cima das lentes. Embora fosse mínimo, Jeongguk sentiu seu lobo uivar ao notar a leve dilatação e o brilho no olhar do loiro, que claramente afetou-se com seu ato. No entanto, tratou de ocultar tal feito ao lhe fitar-lhe aborrecido.
— Que tanto olha? Acaso terminaste de fazer o que mandei? Duvido muito, afinal, dei-lhe três livros e tu sequer abriste o terceiro ainda. — Comentou ranzinza. Jeongguk fechou os olhos por alguns segundos, respirando fundo antes de abrí-los outra vez.
— Alteza, não consigo mais entender uma palavra sequer das orações escritas neste memorando. — Afirmou, se recostando ereto à poltrona onde estava sentado e deixando seus braços descansarem ao lado do corpo, entreabrindo os olhos sonolentos em seguida, para fitar um Park de semblante aborrecido e bochechas meio avermelhadas por tal.
— Então, leia de novo! — Esbravejou.
Tudo bem, podia até fazer um pouco mais de esforço pelo loiro, já que conhecia sua situação — ou assim acreditava — mas realmente estava além de suas capacidades atuais. Nos últimos dias, havia lido livros que iam desde a literatura infantil, até os de magia negra, que aliás eram ilegais e sequer sabia como Namjoon havia os conseguido; virou a noite no dia anterior e se o fizesse de novo, estaria acordado pelo recorde de setenta horas à base de cafeína e centenas de letras miúdas escritas à tinta preta. Sequer conseguia formar as palavras na mente, pois essas pareciam mais embaralhadas do que nunca naquelas folhas de pergaminho antigo. Mas o pior era que, mesmo após tanto esforço, não havia resultado em nada; já que os registros sobre o clã ao qual pertencia eram mínimos, devido ao fato de que quase todos os dados foram queimados após a comoção de anos atrás.
— Por favor, Jimin. — Implorou, a voz soando cansada e mansa. — Sinto que irei desmaiar se ler mais uma frase sequer no momento. Não pode ao menos esperar até o amanhecer para continuarmos com isso?
O garoto lhe encarou durante alguns minutos, a feição mudando de irritada para séria em dois tempos e o alfa arrependeu-se de suas palavras quando um brilho sombrio se fez presente nas pupilas amendoadas. Ele engoliu a saliva e depositou o livro sobre a mesa com uma vagareza atordoante, levando seus dedos curtos até a ponte de seus óculos, os retirando do rosto para então jogá-los em cima do monte de folhas. Espalmou as mãos sobre a mesa e abaixou a cabeça, rindo irônico e maneando-a antes de erguê-la para fitar o Jeon, agora ainda mais próximo que antes.
— Dezoito anos, Jungkook. — Foi seco e simplório em seu comentário, até então incompreensível para o lúpus; até que o de fios claros deslizou a língua rapidamente pelos lábios antes de completar. — Eu esperei dezoito anos; não é o suficiente, uh?
O moreno retesou em seu lugar, calando-se já que não tinha argumento algum para com contestar a sentença dolorosa que proferira. Em poucos instantes compartilhando daquele olhar intenso que transferia muitas sensações, não tardou para que estivessem imersos em uma bolha isolada da qual ninguém mais poderia entrar sem que a própria se desfizesse. Jimin tinha a respiração pesada, sentiu isso, não só pela forma com a qual seu peito subia e descia devido aos movimentos de sua caixa torácica, mas também porquê sua audição apurada conseguia captar os sons baixos do ar saindo de suas narinas, da mesma forma que ouviu perfeitamente o momento em que seu coração falhou algumas batidas antes de acelerar gradualmente; no instante em que deixou de distrair-se com as sensações alheias pars fitar as orbes bonitas e firmes que ele possuía.
— Me desculpe. — Sussurrou, tão baixo que duvidava até mesmo que ele havia ouvido, mas teve sua incerteza findada quando o notou desviar a vista para seus lábios finos e assentir devagar.
Aos poucos, a tensão de fúria foi se dissipando, a medida que as presenças Alfa e ômega se intensificavam instintivamente, acompanhando o ritmo um do outro, dando espaço a um outro tipo de tensão que já parecia ser muito comum dos momentos em que estavam juntos, geralmente irritados, ao que parece, seus lobos gostavam de um conflito. Jungkook sentiu-se estranho, quando aquela vontade imensa de unir-se a ele deu indícios de o apossar novamente, mas ela não vinha de si. Sua visão oscilou entre o normal e um tom claro de avermelhado, ao mesmo tempo em que podia jurar que aquele brilho azul-cintilante iluminou os olhos do loiro por um mísero segundo.
Foi quase; por uma faísca mínima que não voltaram a perder o controle. O contato foi quebrado em um impacto, que foi sentido nos dois, quando o barulho de algo quebrando preencheu os ouvidos mais aguçados devido ao instinto atiçado, gerando uma fina dor em ambos, o que causou alguns breves resmungos de incômodo ao passo em que desviavam seus olhos, já de volta ao comum, para a cena que se desenrolava atrás.
Jeon não tardou a franzir o cenho; Á alguns passos de si, em um canto mais afastado da biblioteca particular, estava o Namjoon, com um olho aberto e outro fechado de sono, esfregando a nuca com uma feição dolorida, enquanto ao seu lado esquerdo, no chão, tinha um abajur — ou o que restou dele — que anteriormente pertencia ao pequeno criado mudo do lado da poltrona onde o platinado antes estava sentado. E ao lado direito, tinha um Seokjin de expressão irritada e com a mão estendida em sua direção.
— Ai, Hyung! Porquê me bateu? — Reclamou, em um tom mais manhoso do que o que normalmente usaria em qualquer situação que não envolvesse o seu parceiro irritadiço.
— Porquê você é um idiota, Namjoon! Por isso.
Ele finalmente abriu os dois olhos, a cena se tornando um pouco cômica se levar em conta seus cabelos apontando para todos os lados e o pouco de saliva acumulando no canto da boca, e o fitou com o cenho franzido.
— Não acredito que dormiu e deixou esses dois cheios de fogo no rabo aqui sozinhos! — Murmurou, abismado. — Se eu não tivesse chegado a tempo, provavelmente o Jimin estaria parindo uma ninhada de doze coelhos na sua cabeça agora! E eu não quero acabar meus dias  limpando bunda de pirralhos! E ainda quebrou o meu abajur, eu vou quebrar é a sua cara, Kim Namjoon!
O esverdeado arregalou os olhos, ainda parecendo estar no mundo da lua por acreditar nas palavras do beta, que lhe deu outro tapa na cabeça para deixar de ser tapado e o empurrou para o lado, sentando-se e cruzando as pernas na poltrona de couro, não sem antes ordenar para ele deixar de ser um imprestável e limpar tudinho. Definitivamente, normalidade era uma coisa que há muito estava desaparecida da vida daqueles que habitavam naquele castelo. Ah, e, provavelmente, o próprio Jeon já havia sido infectado pela aura do lugar; pois sentia que já estava ficando louquinho com tudo aquilo.
— Tudo bem, Jungkook. Você venceu. — Ouviu a voz fina e olhou de esguelha para o ômega, que agora guardava os óculos em uma caixinha prateada enquanto tinha um sorriso sem dentes e ameno no rosto. — Está livre por enquanto. Mas me encontre no jardim, assim que amanhecer.
Sem conseguir formular uma resposta às palavras rendidas do Park, apenas desistiu de o fazer, sendo simples e curto ao acenar em entendimento.
— Certo.
•    •    •
Quando abriu os olhos, não fazia ideias de que horas eram, mas podia julgar que estava na de levantar, afinal, os raios solares já cortavam o céu visivelmente através da janela de vidro em frente a sua cama. Sua cama; ainda era difícil se acostumar com tal pensamento.
Ainda se sentia um tanto quanto cansado devido a diferença enorme entre as horas que passou acordado e o tempo mínimo que descansou, levando em conta o fato de que quando foi liberado já passavam da meia noite; porém, não enrolou ou virou para o outro lado, pois a curiosidade que tinha em saber o que o Park queria consigo no jardim havia conseguido fazer todo o seu sono se dissipar em instantes.
Deixou seus dedos longos tocarem a borda do lençol leve e aconchegante, e a puxou, colocando para o lado direito, descobrindo seu corpo a medida que ia endireitando o tronco e virando-o até deixar seus pés tocarem o chão. Um arrepio percorreu sua espinha devido a temperatura gélida em contato com sua pele morna, mas ignorou a sensação, apenas se erguendo para ficar de pé e seguir até uma grande bacia de água, milagrosamente morna — ou menos fria —, lavou o rosto rapidamente e tratou de caminhar em direção ao guarda-roupa feito de mogno, em design antigo, e o abriu, tendo ciência de que Taehyung já havia colocado algumas vestes para si ali, como fazia sempre.
Não era alguém que se importasse com questões de estilo, e também não era como se ali tivesse coisas muito distintas uma das outras — parecia mais um uniforme, na verdade, um que todos ali usavam, mudando apenas as cores — então, apenas tratou de pegar as primeiras peças que seus olhos captaram, tirou as que usava e começou a vestir-se. A calça, dessa vez, era branca e novamente ficou colada em seu corpo — o que lhe era um tanto quanto vergonhoso, já que na vila costumava trajar vestes que fossem um número maior que seu corpo para não demarcá-lo tanto quanto estava sendo agora — a camisa de manga longa e decote um pouco cavado, tinha um tecido leve e em tom azulado, porém claro; por fim, calçou os sapatos fechados, impecáveis e brancos, e apanhou o sobretudo longo, ainda sem realmente vesti-lo.
Jeongguk admitia não ser tão fã de branco, mas não era como se isso lhe importasse. Não se deu ao trabalho de pentear os cabelos, achava isso uma perda de tempo, se levar em conta o fato de que bagunçariam outra vez, em algum momento; certo, poderia ser taxado como desleixado, mas, novamente, quem liga?
Quando estava se seguindo para fora do quarto, somente então notou um objeto prateado reluzindo ao lado de sua cama; uma bandeja, cheia de comida. O alfa não estava com fome, mas tinha de concordar que o cheiro era muito do atraente; além de que ainda estava um pouco escuro, então não seria problema parar para comer um pouco. E assim o fez. Ao aproximar-se dos mantimentos, agradeceu internamente pelo príncipe ter funcionários tão competentes naquele castelo esquisito; mas antes que pudesse iniciar seu desjejum, notou um pequeno pedaço de pergaminho posto embaixo da xícara, e franziu o cenho ao ver aquela caligrafia desleixada e quase ilegível.
Pequeno agradecimento por me aturar naquele dia. Coma tudo, ou eu mando o Nam te matar por me fazer ter que usar aegyo e ainda lavar a louça durante três dias para convencer o Jin a cozinhar.
Ah, e, embora eu não saiba o motivo, não deixe o Jimin te explorar tanto assim, ok? *Risos*
- K. Taehyung."
Riu baixo, se deixando abrir um sorriso ameno ao lembrar-se do garoto, já havia simpatizado com ele, embora se conhecessem a poucas semanas; ele lhe trazia uma sensação de conforto, como se fossem amigos a anos. Era legal conversar sobre besteiras com ele, ainda que esses momentos fossem raros. Sabia que ele estava agradecendo pelo momento de cerca de três dias atrás, quando o encontrou novamente chorando embaixo da escada; já era tarde da noite e Jeongguk somente o encontrou porque estava sem sono e havia resolvido caminhar um pouco. Preocupado, lhe cedeu o ombro e surpreendeu-se quando ele não negou, seu pranto se tornando maior. O alfa o questionou pelo motivo, mas tudo o que lhe respondeu, em meio aos soluços, era que havia sonhado com eles.
Depois de esvaziar quase toda a bandeja — já não conseguiria comer tudo, por mais que estivesse uma divindade; lembraria de agradecer ao beta mais velho depois, embora houvesse a possibilidade de acabar levando um tapa na nuca e um indicador estendido na frente de seu rosto junto com a ordem de que guardasse as coisas dentro das calças se não quisesse perdê-las. Acredite, já aconteceu uma vez. — tratou de sair do cômodo, caminhando a passos despojados até a saída do castelo, não tardando a abrir as grandes portas e adentrar o jardim de gelo.
A princípio​ nada viu, mas não demorou até que um farfalhar de espadas preenchesse seus ouvidos, o fazendo seguir curioso o som. Foram poucos minutos de caminhadas pelo extenso lugar, até que sua visão captasse uma silhueta movendo-se por sobre a neve enquanto empunhava elegantemente uma espada entre os dedos curtos e precisos, cobertos por luvas pretas. Sem sequer notar, parou, observando atentamente a cena; as vestes negras balançavam conforme ele se movia, a lâmina reluzente cortando o ar em diversas posições, que em conjunto mais pareciam compôr uma dança magestosa executada por aquele garoto. Seu olhar era sério e intenso, focado no que fazia; em certo momento, Jeon supreendeu-se ao vê-lo se abaixar, girar com a perna direita estendida, como se fosse derrubar seu oponente, e correr a passos precisos até uma árvore, usando seu tronco para pegar impulso com os pés antes de pular, cortando inclinado; o que, se fosse em um combate real, significaria a cabeça de seu inimigo fora do corpo.
E então, ele pousou, ofegante e com os joelhos flexionados, a mão esquerda apoiada no chão branco, enquanto sua destra estava erguida no ar, ainda empunhando a espada, na qual estava tão polida que o lúpus conseguiu ver a si próprio reluzindo nela. Aparentemente, o ômega também o viu, pois sorriu minimamente para si através do reflexo e ergueu o tronco, jogando seus fios loiros e um pouco molhados para trás antes de se virar e o fitar diretamente.
— Desculpe. Você demorou, então resolvi treinar um pouco. — Explicou-se, embora não fosse necessário. Jungkook ainda estava maravilhado, sua mente repassando alguns momentos da cena anteriormente vista.
— Não sabia que lutava.
— Aprendi quando tinha quinze anos. Pedi ao Namjoon que me ensinasse. — Afirmou.
— É… incrível. — Foi sincero, dizendo o primeiro que veio em sua mente.
Jimin sorriu, fazendo seus pequenos olhos encolherem, e isso de alguma forma fez seu peito se aquecer, sendo instantâneo quando seus lábios se ergueram, devolvendo-o. Mas logo o loiro modificou o sorriso por um de canto, enquanto dava alguns passos curtos e divertidos para trás, balançando levemente o objeto em mãos.
— E você, Jeongguk-ah? — Perguntou, o fazendo erguer uma sobrancelha ao vê-lo se afastar. — Sabe usar uma espada? Ouvi dizer que há alguns torneios anuais em algumas vilas do reino.
— Um pouco, mas eu nunca participei. — Respondeu, desconfiado, dando um passo para diminuir a distância que continuava a crescer entre ambos.
Ele inclinou levemente a cabeça ao lado.
— Porquê? — o alfa deu de ombros.
— Desinteresse. — foi simplório e sincero. — Nunca gostei muito de me socializar.
— Entendo. — Finalmente parou, calando-se por uns instantes antes de abrir outro sorriso arteiro. — Quer tentar?
Jungkook tardou alguns segundos para entender do que se tratava sua pergunta, mas quando o fez, arregalou os olhos e tratou de negar, usando até gesticulação com as próprias mãos para isso.
— O quê? Não! — Esbravejou, nervoso.
— Ora, vamos! Só um pouco, prometo pegar leve com você. — Insistiu. — Não vai negar um pedido real, certo?
Sabendo o quão teimoso ele podia ser, o Jeon apenas suspirou, assentindo.
— Certo…
Por alguns segundos, valeu a pena ter aceitado, somente por ver aquele sorriso iluminado no rosto pálido; mas bastou ele desembainhar outra lâmina e jogar em sua direcao, para que o desespero voltasse a se estampar em sua face. Bastou o tempo rm que levou para se abaixar e tomar em mãos a base da espada, empunhando-a um pouco inclinada na direção do príncipe, sem a menor firmeza ou confiança, que ele lhe sorriu ladino uma última vez, antes de correr e vir em sua direção, não demorando nada para vir com seus golpes consecutivos, deixando-o​ assustado.
Jeongguk tinha os olhos arregalados, conseguindo se proteger apenas com o reflexo de seu corpo, que parecia comandar seus músculos e o fazer se defender usando sua arma. Park parecia inspirado e divertia-se com as reações totalmente afobadas de seu oponente. O alfa estava indo bem até então, mas o loiro resolveu começar a agir; chocou seu metal com o alheio na parte superior, na inferior, na superior novamente e outra vez na inferior; no quinto impulso, deu a entender que iria seguir o padrão, movendo seu braço para cima, no entanto, de última hora, desviou do golpe e abaixou seu corpo, estendendo a perna direita e a girando no chão, deixando um rastro na neve, e acertando as pernas do moreno, que não caiu, mas desequilibrou-se ao ponto de recuar alguns passos. Aproveitando-se da distração dele, Jimin apenas se ergueu rapidamente e, antes que ele pudesse erguer a espada, pousou a ponta da sua própria apontada no lado esquerdo do peito dele.
— Você está morto.
O lúpus, ofegante, demorou um pouco para que pudesse raciocinar o que havia acontecido, mas quando o fez, apenas avistou o belo sorriso presunçoso dançando nos lábios fartos.
— Primeira regra, Jeongguk: use as características de seu oponente contra ele mesmo. — Ditou, não parecendo nenhum pouco cansado, ao contrário, com mais vigor. — Você é grande e forte, como sendo um lúpus. Logo, sua agilidade para se mover é menor, e foi aí que eu investi. Encontre algo em mim, que possa usar e vai conseguir. Ou não. — riu.
— Entendi. — Foi curto, seu lobo detestando aquela sensação de perda, o orgulho lupino ferido.
— Outra vez.
Ele deu tempo para que o acastanhado se situasse, enquanto movia-se em alguns passos para trás, nunca quebrando o contato visual. Jeon apenas revirou os olhos, fechando o semblante, um pouco mais focado que antes já que não pretendia perder duas vezes. Mas nem tudo é como nós queremos, certo?
— Venha. Me ataque, dessa vez. — o aloirado desafiou, recebendo um olhar firme do alfa, que obedeceu, vindo a passos precisos em sua direção, mas antes que sua espada se aproximasse do corpo alheio, foi barrada pela semelhante, deixando ambas em uma cruzada, rente aos rostos.
Durou poucos segundos até que fosse findada, com o Jeon afastando a sua para vir outra vez, com um golpe de lateral agora; Jimin o expeliu, assim como fez com todos os outros que seguiram, frustrando o moreno. O farfalhar das lâminas se encontrando podia ser ouvido de longe; vários rastros estavam sendo desenhados no chão, e se visto de cima, a cena seria considerada estremamente instigante, com os dois corpos se chocando, trajando tons completamente opostos; se Jimin era o Ying, Jungkook era o Yang. Em uma composição bela e distinta, como água e óleo; não se misturavam, mas se uniam.
Em uma investida, o mais novo quase acertou o outro, mas Park desviou no último instante, abaixando-se de modo a ver a lâmina cortando ao seu lado, riu pela adrenalina, antes de erguer-se em um rompante e empurrá-lo, fazendo-o recuar dois passos e se fixar novamente em terra.
— Deixe seu corpo leve, Jungkook. Tente prever meus movimentos. — Alertou, arrastando a espada pelo gelo, cortando-o antes de empunhá-la e vir com o ataque dessa vez.
O Jeon, por reflexo, conseguiu defender-se em todas as estocadas do mais baixo, até que suas lâminas estivessem novamente em cruzada, dessa vez na parte de baixo, deixando-os novamente próximos, mas sem nada para atrapalhá-los. Permaneceram sérios por alguns segundos, até o alfa umedecer seus lábios avermelhados em nervosismo e o outro deixar seus semelhantes se erguerem nos cantos, voltando a se mover ao impulsionar suas espadas e vir com um novo golpe na região superior, se seguindo com um no outro lado. O moreno ainda estava um tanto quanto distraído, e ficou surpreso quando o viu rodar o próprio corpo e sumir de sua vista, não lhe dando tempo de virar-se, ao passo que sentiu o gelado da peça em contato com sua nuca, vindo da parte de trás, assim como a respiração compassada do loiro, quase colado ao seu corpo.
— Está morto, novamente. — Concluiu, com um sorriso fácil nos lábios gélidos, irritando-o. — Mais uma vez?
Jeongguk, decidido, inclinou seu rosto para trás, ficando a centímetros do do Park.
— Com certeza.
E novamente, o farfalhar das espadas veio a preencher o ambiente; o terceiro duelo sendo o mais arduo e demorado, e, embora o castanho estivesse nitidamente cansado, não tirava o olhar fixo do rosto, focado no que fazia. E Jimin estava gostando de ver isso, ainda que provocasse-o a cada instante.
— Vamos lá, Jungkook! Controle sua respiração, consigo ouvir seus batimentos daqui. — Afirmou, enquanto estava um pouco afastado, percebendo-o vir em sua direção.
E, outra vez, as espadas vinham a se chocar.
Os golpes eram diversos, vinham de várias formas e em diferentes ângulos e intensidade. Em certo momento, a espada do mais velho passou quase acertando o maior, mas ele inclinou seu corpo para trás, vendo perfeitamente a lâmina cortar horizontalmente em cima de seu tronco e rosto, até que se firmasse ereto novamente. O lupus estava sério e decidido, começava a se irritar cada vez mais por não conseguir ganhar, e o olhar despojado de sorriso presunçoso que o ômega lhe lançava, também não ajudava.
— Seja ágil, Jungkook. Ágil. — balbuciou o aloirado. — Você é um Alfa, ou não é?
Rosnou, se descontrolando e avançando em cima do garoto, que somente estava esperando por isso. Utilizando a frustração do castanho contra ele mesmo, desviou de seu golpe e veio com outro em seguida, chocando suas espadas consecutivamente enquanto o fazia caminhar para trás e, em um último momento, firmou os pés no gelo e rodou seu corpo para ganhar impulso, acertando sua lâmina na semelhante até que esta escapasse das mãos alheias e fosse ao chão. Por fim, deu uma rasteira no alfa que, desnorteado, caiu de joelhos no gelo, a sua frente, e com a sua espada rente ao pescoço.
Com a ponta da língua sapeca entre os dentes, finalizou sua sentença:
— Você está morto, Jungkook-ah.
O alfa tinha sua cabeça baixa, respirando ofegante e pesado. No entanto, quando este ergueu-a, lentamente, o sorrisinho no estampado no rosto do Park se desfez, dando lugar a um semblante preocupado. Engoliu a saliva, ao que seus olhos se encontravam com os olheios; estavam negros, completamente negros enquanto a íris reluzia em um vermelho intenso. Tremulando, Jimin o viu se erguer, lhe fazendo recuar alguns passos para trás, devagar e cautelosamente, enquanto via seus cabelos mudarem de cor gradualmente, tornando-se negros como a noite, com algumas partes vermelho-escuro, e sua pele tornando-lhe completamente branca, algumas veias do rosto ficando aparentes.
Ele havia tomado sua forma real.
O ômega empunhou sua espada na horizontal, estendendo-a na frente de seu corpo e usando as duas mãos, mantendo-se o mais afastado possível.
— Se afasta! — Ordenou, não sendo obedecido.
O moreno apenas riu ladino, aproximando-se enquanto o via recuar, até que estivesse rente a lâmina direcionada à  sua barriga e,assustando o pobre Park, agarrou a ponta com sua destra. Jimin partiu os lábios e arregalou os olhos, ao vê-lo sangrar, sem se importar com isso, algumas gotas do líquido escuro contrastando com o branco da neve e de suas vestes, até que ele puxasse o metal de suas mãos e o jogasse para longe, deixando-lhe a total mercê de si.
Amedrontado, Jimin virou-se, preparando-se para correr, no entanto, antes que pudesse o fazer, mãos fortes rodearam-lhe firmemente a cintura, o prendendo antes de o girar e o jogar no chão frio, ficando por cima de si. Ao entreabrir suas pálpebras — que havia fechado pelo impulso do impacto — sentiu seu peito acelerar e sua respiração se tornar ofegante; sentia-se extremamente frágil abaixo daquele ser que não sabia do que era capaz.
— Jungkoo- — Ele rosnou, lhe interrompendo e o fazendo estremecer. Virou o rosto para o lado, cerrando firme as pálpebras — Alfa — corrigiu-se — Por favor... Pare. Está me assustando.
Seu tom sussurrado e amedrontado, acoplando-se com o intenso cheiro de medo que se espalhava pelo jardim fez com que o Jeon despertasse daquele torpor insano, lhe fazendo arregalar os olhos e sentir-se imediatamente culpado por seus atos, ainda que não fosse sua culpa.
— Jimin, eu… Me desculpe, e-eu...
— Augetur Virtute. — Ele balbuciou, virando o rosto para fitar-lhe, com uma expressão surpresa, como se houvesse acabado de descobrir algo muito importante.
O alfa franziu o cenho, sem entender.
— O quê?
— Augetur virtute. — Repetiu, estranhamente abrindo um sorriso enorme enquanto seus olhos umedeciam-se. — Esta é a sua, Jungkook: a raiva.
Certo, continuava sem compreender nada. Mas não era novidade mesmo.
— Parece que, finalmente, estamos progredindo, Kook-ah.

Malditos treinamentos e a insanidades que eles lhe trazem.

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